Como a Psicologia Social revolucionou a área da Saúde Mental

Estruturada praticamente como uma ciência irmã da Sociologia, a Psicologia Social é um ramo da Psicologia responsável por estudos que sempre buscaram entender, por meio da análise das relações sociais, o comportamento individual.

No entanto, como é conhecido, a Psicologia Social se dividiu em duas partes ao longo dos anos e essa configuração persiste até os dias de hoje.

A primeira parte, tendencialmente mais psicológica, tratando sobre as ações do indivíduo de acordo com as influências que recebe dos grupos dos quais faz parte socialmente falando.

E a segunda, mais sociológica, voltada um pouco mais aos grupos sociais, tendo como elemento importantíssimo a influência do coletivo de seus membros sobre si próprio, assim como o relacionamento de grupos para com outros grupos.

Hoje, enquanto ciência consagrada, podemos enxergar seus impactos na grande área da saúde mental e é sobre isso que trataremos nas linhas a seguir.

Conhecendo um pouco mais sobre a história da Psicologia Social

Historicamente, os antecedentes da Psicologia Social como disciplina científica estão diretamente vinculados à segunda metade do século XIX, período em que Psicologia e Sociologia estavam ainda se estabelecendo enquanto ciências a serem consideradas.

Anteriormente a consolidação de ambas, as reflexões psicossociais (se assim podemos dizer) ficavam todas por parte da Filosofia – que desde Sócrates, Platão e do próprio desenvolvimento do pensamento filosófico, vinha abrindo caminho para outras formas de conhecimento.

Finalmente, anos depois, a Psicologia Social se consolida enquanto uma ciência única nas décadas imediatamente posteriores ao fim da Segunda Guerra Mundial, quando se inicia o êxodo de cientistas sociais e estudiosos da Psicologia da Europa para os Estados Unidos, tornando qualquer contato intelectual possível em oposição ao regime nazista (Almeida, 2018).

Atualmente, consolidada como foi dito acima, busca-se por meio da Psicologia Social o entendimento de questões complexas, profundas, dos seres humanos em relação a seus pares e ao convívio que estes estabelecem com aqueles.

De acordo com Almeida (2018), os psicólogos sociais se interessam em saber como as pessoas influenciam umas as outras no contexto da sociedade, entender as atitudes, como o preconceito se forma, a conformidade e saber se as pessoas se comportam  de forma diferente quando estão em grupo ou sozinhas.

O impacto direto das representações sociais na Saúde Mental

Tudo que pensamos, falamos ou fazemos está repleto de representações sociais, pois como todos nós sabemos, somos todos seres sociais e logo quando nascemos somos presenteados por nossos familiares com algumas dessas representações.

Descobrimos, sempre por meio delas, aquilo o que é bom e o que é ruim, o que se deve ou não dizer, com quem podemos ou não nos relacionar, dentre um universo de outras coisas socialmente aceitas ou não.

Na realidade, as representações sociais são quem determinam nossa visão de mundo e nossa reação frente a outras pessoas, coisas e acontecimentos. Elas modelam e permitem nossa vida socialmente. (Silva; Medeiros; Costa; Freitas, 2017).

Sabendo disso, que elas são produto e processo de uma atividade de apropriação da realidade externa ao pensamento, e de elaboração psicológica e social desta mesma realidade (Jodelet, 2005), podemos entender então um pouco mais sobre sua relação direta com a Saúde Mental.

De acordo com os estudos desenvolvidos dentro da Psicologia Social, nos diferenciamos de quem não somos através de representações sociais; estas, que modelam as percepções que temos de nós mesmos, assim como as que construímos para classificarmos os outros ao nosso redor.

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Segundo o que se conhece por meio dessa ciência, os preconceitos, os estigmas e a marginalização social do outro, existiriam também em decorrência dessas mesmas representações, que ao contrário do individual, somente tomariam sua forma (preconceituosa em essência) e ganhariam sua força inicialmente em sentido coletivo.

Mas, na realidade, o que isso significa? Que, com essas descobertas, a exclusão dos marginalizados, dos considerados loucos, esquizofrênicos – dentre outros tantos classificados em meio a tantas classificações presentes dentro da sociedade – teve sua origem psicossocial encontrada.

Se passa a entender, com os avanços da Psicologia Social em pesquisas e conhecimentos, os porquês da recorrente negligencia e do comum afastamento social das pessoas em relação ao “outro”, ao “doente”.

No ideário social, por outro lado, cria-se a ideia de que os loucos são loucos porque são, porque são diferentes de mim, mas nunca por conta de um senso comum construído para afastar os “problemáticos” da sociedade, reproduzido indiretamente pelas pessoas que dela fazem parte.

A partir da Reforma Antimanicomial, dos estudos realizados em Psicologia Social e Sociologia, iniciou-se então a desconstrução desses estigmas – que infelizmente permanecem no ideário de muitas pessoas até hoje – pelas vias corretas de fato, pelo caminho certo.

A Psicologia Social revolucionou a Saúde Mental com seu surgimento, mudou suas diretrizes e permitiu novos entendimentos acerca de acontecimentos recorrentes e criadores de novas barreiras sociais.

As contribuições da Psicologia Social para a saúde coletiva

Realizada a explicação acerca das representações sociais, conceito fundamental para que se entenda a relação Psicologia Social e Saúde Mental, seguimos para tratar um pouco melhor sobre a saúde coletiva.

Como demonstrou June Hahner (1993) em seus estudos sobre a história da pobreza urbana no Brasil, o processo de adoecimento das pessoas sempre esteve ligado à precariedade enfrentada por elas em decorrência de suas condições de vida.

As práticas psicológicas em saúde têm, recentemente, considerado que a saúde em si não é isenta de história, mas ao contrário. A saúde tem uma história na vida cotidiana das pessoas e das comunidades (Zurba, 2011).

Ao longo dos anos foi possível enxergar ainda mais a influência positiva da Psicologia Social na saúde coletiva.

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A noção de que o sintoma deve ser entendido dentro do campo simbólico, como forma de linguagem/comunicação do indivíduo em relação ao mundo que vive, surge desse campo da Psicologia.

Sob a perspectiva de superar a dialética “saúde versus doença”, passou-se a compreender a formação dos sintomas humanos no âmbito da totalidade dos sujeitos, formada pela tríade físico, mental e social.

De acordo com Zurba (2011), a compreensão do sujeito sócio histórico, quando entendida neste contexto, implica observar o sintoma como linguagem, deixando de lado para entender um quadro somente possíveis sintomas; contribuição advinda da Psicologia Social.

Os aspectos familiar, social e comunitário encarados pelo indivíduo passam a ter relevância e, ao mesmo tempo, a alterar a própria noção do que é trabalhar com saúde, do que é trabalhar com saúde mental e do que é ser psicólogo ou de áreas correlatas.

Conforme a promulgação da Constituição de 1988 e a criação do SUS:

É a partir do “território” de moradia do sujeito que os profissionais das equipes de saúde devem iniciar seu olhar sobre o sintoma ou queixa. Ou seja, é no bairro, na família, nas relações imediatas do campo da particularidade na vida cotidiana que os sintomas surgem e/ou se consolidam (Zurba, 2011).

A Psicologia Social, nesse sentido, permitiu pensar a saúde e a produção de sintomas como um processo histórico, colocando em xeque o modelo linear (causa/ sintomas) historicamente hegemônico na Psicologia, revolucionando essa ciência e a saúde coletiva para sempre.


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3 Comentários


  1. Oi Antonia! Tudo bem com você?

    Eu entendo quando você diz ser simplista essa posição, mas não consigo isentar a sociedade no reforço a certas condições, seja a da loucura ou a da criminalidade. A sociedade tem sim uma parcela grande de responsabilidade em relação a essas pessoas, seja criando e reforçando estigmas, seja marginalizando e segregando parcelas da população que a compõem. Caso você queria conversar melhor sobre isso, estou disponível no e-mail pietronavarro96@hotmail.com

    Obrigado pelo seu comentário!! Um grande abraço!!

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  2. Olá! Gostaria de fazer uma sugestão: que ao final dos artigos sejam listadas as referências completas que foram utilizadas na construção destes.

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