Green Care Approach: A vida em Natureza revolucionando a Saúde Mental

Usar da natureza para nutrir uma boa saúde não é uma ideia nova na história como algumas pessoas podem imaginar. Hospitais, igrejas e prisões, por exemplo, têm sido associados a espaços que historicamente se utilizam de lugares ao ar livre e em meio à natureza como elementos terapêuticos de benefícios positivos às pessoas.

Durante a Idade Média, muitos hospitais e mosteiros que cuidavam de pessoas doentes incorporavam tradicionalmente a seus pátios com arcadas para fornecer abrigo externo belos jardins para uso dos pacientes, como uma forma de tranquiliza-los por meio do contato com plantas, flores e seus derivados.

Com o passar dos anos, à medida em que a medicina e os cuidados de reabilitação se desenvolveram, o uso da natureza se transforma para ser classificado então como maneira de tratar não apenas pessoas necessitando de cuidados físicos e fisiológicos, como também pessoas com dificuldades psicológicas, de aprendizado ou mesmo de outras origens.

A abordagem Green Care (que pode ser traduzida como “Cuidado Verde”) nasce desse desenvolvimento, aprimorando o uso da natureza como ferramenta terapêutica, explorando novas técnicas de cuidado e permitindo com que pessoas vivendo dificuldades – muitas delas afastadas de ambientes arbóreos e verdes – possam se beneficiar desse contato natural novamente.

Falemos um pouco melhor sobre ela e seus benefícios!

O conceito de “cuidar” para o Green Care Approach

Uma das distinções que geralmente pode ser feita entre o Green Care e outras atividades que normalmente são realizadas em ambientes naturais (caminhada, canoagem e assim por diante) é a de que o Green Care está destinado a fornecer uma gama de benefícios direcionados e voltados para um determinado grupo de clientes, de forma não aleatória. 

Atividades dentro da natureza podem contribuir para a saúde e o bem-estar das pessoas de uma maneira geral, mas mesmo que sejam organizadas, pode haver nessas atividades pouca ou nenhuma ênfase nos resultados terapêuticos a serem obtidos por seus participantes, ao contrário do que acontece nas atividades da abordagem.

Quando essas atividades se concentram em ajudar pessoas vulneráveis ​​a alcançarem resultados específicos, de maneira a oferecer benefícios baseados na presença em natureza e que visem o auxilio a dificuldades psicológicas, fisiológicas e sociais de alguém, aí sim elas passam para os domínios do Green Care Approach. 

Existem, apesar de sua amplitude, diferenças nos níveis de cuidado fornecidos pelas diferentes opções de atenção inerentes as atividades e programações que compõem aquilo que se considera Green Care.

Algumas atividades funcionam como programas de Terapia Estruturada, como a Terapia Horticultural e a Terapia Assistida por Animais, com objetivos claramente definidos e orientados para o paciente, enquanto outras buscam oferecer benefícios um pouco mais amplos e coletivos.

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Ostensivamente, o mesmo meio ambiente e algumas de suas ferramentas inerentes podem ser utilizadas tanto para terapias individuais e específicas, buscando respostas terapêuticas específicas, quanto para a promoção de efeitos positivos mais amplos e em grupos também mais amplos. 

A Terapia Assistida por Animais, por exemplo, usa o contato com animais como uma ferramenta para o terapeuta trabalhar com clientes individualmente e abordar áreas específicas de seus dificuldades.

Enquanto fazendas de cuidados usam animais no ambiente agrícola para obter benefícios mais amplos voltados para um número maior de pessoas, resultantes da ocupação significativa, de oportunidades para cuidar e de outros elementos positivos como o próprio “estar na natureza”.

Em suma, o ambiente natural pode ser utilizado para a abordagem de diferentes aspectos, um pouco mais gerais, da saúde humana, assim como, quando necessário, de aspectos mais específicos, voltados normalmente ao cuidado individual humano. 

Nessa lógica, a palavra “cuidado” no Green Care é tomada em seu sentido mais amplo, de forma a compreender elementos de saúde, reabilitação social, educação ou mesmo de oportunidades de emprego para pessoas pertencentes a grupos marginalizados da sociedade, como responsabilidades/objetivos de suas práticas.

As dimensões “comuns” do Green Care

• Desenvolvimento de rotina diária e estrutura

• Participação na produção por meio de atividades significativas (mas não em ambiente pressionado)  

• Interação social e oportunidades de contato social 

• Trabalhar com os outros para um propósito comum 

• Oportunidades de envolvimento e de “ter uma palavra a dizer” no desenvolvimento de atividades

• Desenvolvimento de habilidades, competência e identidade; e o desenvolvimento da autoestima e da estima dos outros 

• Oportunidades de realizar atividade física

• Associação com trabalho, recebimento ocasional de pagamento nominal ou despesas

• Possíveis oportunidades de emprego remunerado

• Acesso potencial a produtos das fazendas ou da horta

As dimensões “naturais” do Green Care

• Senso de conexão com a natureza, possivelmente satisfazendo uma necessidade espiritual

• Visão da natureza como inerentemente pacífica, algo a exercer um efeito calmante 

• Senso de bem-estar através da crença de que a natureza e o ar fresco são inerentemente saudáveis

• Amor pela natureza ao se envolver com ele sem grande esforço

• Oportunidade para nutrir plantas e animais e a satisfação que se segue

• Proteger a natureza – cumprimento do desejo de proteger o meio ambiente de danos causados por pesticidas e outros produtos químicos

• Trabalhando em conjunto com a natureza para mantê-la ou melhorá-lo

• Ser governado pelas necessidades do meio ambiente através da necessidade de plantar ou colher em momentos apropriados – o ambiente exige o trabalho

As ferramentas terapêuticas do Green Care Approach

1) Care Farming (Agricultura de Cuidado)

O Care Farming pode ser definido como uma atividade que pressupõe o uso de fazendas e paisagens agrícolas como base para a promoção de benefícios mentais, físicos/fisiológicos e educacionais, às pessoas que dele participam, através de atividades agrícolas e suas variantes.

Ele surge de parcerias entre agricultores, provedores de saúde e assistência social e seus participantes. Todas as fazendas de cuidado oferecem alguns elementos de agricultura em diferentes graus, seja em horticultura, pecuária, uso de máquinas ou manejo florestal.

Entre elas, algumas estão mais voltadas para o oferecimento de contatos terapêuticos com o gado agrícola e participação no cultivo de plantações, enquanto outras estariam mais habituadas ao oferecer de Terapia Assistida por Animais e Terapia Hortícola.

É importante e curioso destacar que para algumas das pessoas que fazem uso do Care Farming, é a notável ausência de elementos de “tratamento” ou “institucionais” e a presença de uma fazenda comercial que permite o contato com o agricultor, a família do agricultor e a equipe, que constituem uma reabilitação social bem-sucedida.

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Enquanto, por outro lado, a situação em outras fazendas de cuidado pode ser mais “cuidadosa” e “cuidadora”, orientada, com o elemento agrícola presente principalmente para a produção de benefícios aos participantes, e não para a produção agrícola comercial.

2) Animais e o Green Care

Intervenções Assistidas por Animais (IAA) é o termo geral usado para uma variedade de maneiras de se utilizar animais na reabilitação ou assistência social de seres humanos (Kruger e Serpell, 2006). Isso poderia envolver terapia pura ou incluir os animais em várias atividades. 

Terapia Assistida por Animais (TAA) é o termo usado para uma intervenção dirigida a um objetivo, em que um animal que satisfaz certos critérios é parte integrante do processo de tratamento de um cliente humano, em particular, um processo que é dirigido, documentado e avaliado por profissionais.

Atividades Assistidas por Animais (AAA) são usadas para um serviço menos controlado, que pode ter um efeito terapêutico, mas que não é uma terapia verdadeira em sentido estrito. Tanto pessoas da área da saúde quanto pessoas comuns podem estar envolvidas nessas atividades. 

O papel terapêutico dos animais de companhia está bem estabelecido para pessoas fisicamente doentes, pessoas com transtornos psicológicos, pessoas emocionalmente abaladas, prisioneiros, usuários de drogas, idosos e crianças. 

A evidência foi revisada recentemente por Fine (2006). O contato com animais de companhia está associado a mudanças positivas na função cardiovascular e na concentração de vários neurotransmissores, na redução de distúrbios psicossomáticos e aflições, e a um número menor de visitas por ano de idosos ao médico. 

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De acordo com McNicholas e Collis (2006), o apoio social de animais de estimação, por exemplo, pode ser um substituto para a falta de apoio humano, fornecendo uma facilitação das obrigações de relacionamento, reforçando a reorganização, restabelecendo rotinas e “complementando” o suporte humano existente.

Este e outros estudos demonstraram a robustez dos efeitos dos animais de companhia também como catalisadores da interação social entre as pessoas.

Durante as últimas décadas, dentro do conceito de Green Care, o papel terapêutico de cavalos e animais de fazenda tem sido amplamente implementado para pessoas com problemas físicos, psicológicos e sociais (Bokkers, 2006).

Intervenções Assistidas por Animais em fazendas podem ser oferecidas como um serviço especializado ou como parte de um serviço mais amplo com trabalho ou atividades variadas na fazenda. 

As pessoas podem cuidar e montar cavalos ou burros, ou trabalhar com gado, ovelhas, cabras, coelhos, porquinhos-da-índia ou galinhas. Muitas vezes, cães ou gatos estão presentes nas fazendas, e os clientes normalmente preferem interagir com eles.

Constata-se que animais podem afetar positivamente a saúde física/fisiológica humana em duas direções, ambas envolvendo componentes psicológicos:

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1) Estimulando o exercício e a condição física, resultando também em redução do estresse e em aumento do bem-estar mental

2) Estimulando mecanismos psicológicos levando, por sua vez, a uma melhora em relação a proteção e ao desenvolvimento de transtornos psicossomáticos e aflições.

3) Horticultura e Terapia

A Horticultura historicamente tem sido utilizada como terapia principal ou como coadjuvante de terapias no tratamento de doenças. Também tem sido utilizada para alcançar benefícios sociais e psicológicos para indivíduos e comunidades desfavorecidas e promover a saúde e o bem-estar físico e psicológico dessas pessoas.

Horticultura e Jardinagem são usadas por muitos terapeutas ocupacionais para promover o desenvolvimento de habilidades motoras e também para desenvolver habilidades sociais e proporcionar oportunidades sociais, particularmente para aqueles com dificuldades em saúde mental.

Juntamente com o uso da Horticultura em Terapia Ocupacional, as práticas de Terapia Hortícola e Horticultura Terapêutica seriam igualmente desenvolvidas (Sempik et al, 2003).

Essas abordagens têm formato e estrutura reconhecidos, uma pedagogia bem definida e, em alguns países – como nos Estados Unidos –, organizações profissionais.

Os termos Terapia Hortícola e Horticultura Terapêutica são frequentemente usados ​​na literatura, as vezes alternadamente, para descrever o processo de interação entre o indivíduo e as plantas ou jardins que, na maioria dos casos, são facilitados por um profissional treinado.

A instituição de caridade britânica Thrive usa as seguintes definições de Terapia Hortícola e Horticultura Terapêutica, que foram acordadas por profissionais britânicos em uma conferência sobre Desenvolvimento Profissional realizada em setembro de 1999:

“Terapia Hortícola diz respeito ao uso de plantas por um profissional treinado como meio pelo qual certas metas clinicamente definidas podem ser cumpridas.

E a Horticultura Terapêutica é o processo pelo qual os indivíduos podem desenvolver o bem-estar usando plantas e Horticultura. Isto é conseguido através do envolvimento ativo ou passivo.”(Growth Point, 1999)

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A distinção é que a Terapia Hortícola tem um objetivo clínico pré-definido semelhante ao encontrado na Terapia Ocupacional, enquanto a Horticultura Terapêutica é direcionada para melhorar o bem-estar do indivíduo de forma mais generalizada.

Recentemente, o termo “Horticultura Social e Terapêutica” (HST) tornou-se amplamente utilizado (particularmente no Reino Unido), uma vez que as interações sociais, os resultados e as oportunidades são uma parte importante das atividades e processos dos projetos de hortas terapêuticas.

4) Ecotherapy (Terapia Ecológica)

A Ecoterapia contemporânea pode ser descrita como um modelo de terapia bastante desenvolvido em padrões ecológicos e que adota uma abordagem de “saúde do ecossistema” com um foco amplo para a transdisciplinaridade. 

Ela enfatiza atitudes sociais, bem como pesquisas e atividades que implicam um elemento de reciprocidade entre o humano e a natureza, e que promovem ações positivas sobre o meio ambiente que melhoram o bem-estar da comunidade. 

O estrutura da Ecoterapia contemporânea delineia dois níveis de envolvimento: (1) O nível micro do processo terapêutico e (2) o nível macro dos processos sociais mais amplos.

Esse processo implicaria em uma visão de si como parte de um “todo maior”, algo que os indivíduos passam a apreciar e a cultivar, gerando reciprocidade em relação ao ecossistema.

Os poderosos efeitos dessa dimensão irradiam do “microcosmo” pessoal para o “macrocosmo” exterior dos parâmetros sociais.

A Ecoterapia traz à luz ao esclarecimento de que a natureza não apenas nos ajuda a encontrar um equilíbrio biopsicológico saudável, mas que a saúde de nosso ecossistema é um elemento inextricável de nossa comunidade e sistema social.

A prática ecoterapêutica não pode, portanto, contornar questões sociais, nem tão pouco pode contornar questões de saúde pública e de política.

Espaços e projetos ecoterapêuticos também podem ser usados ​​pela comunidade em benefício do público em geral e do ecossistema; eles também ajudam o público a se reconectar com a natureza e podem levar a mudanças comportamentais e sociais. 

A Ecoterapia contemporânea pode, portanto, ser definida como um termo genérico para todos os métodos baseados na natureza, visando o restabelecimento do bem-estar recíproco humano e ecossistêmico.

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Uma abordagem transdisciplinar e ecossistêmica voltada para o aprimoramento colaborativo da saúde física, psicológica e social das pessoas, comunidades e ecossistemas.

Esses resultados são alcançados através do desenvolvimento de uma relação pessoal e coletiva próxima com o ecossistema natural.

5) Wilderness Therapy (Terapia da Natureza Selvagem)

Virar-se para a natureza e sua configuração selvagem em busca de oportunidades de crescimento da consciência pessoal e realização de mudanças interiores não é uma ideia nova; o processo existe nas culturas humanas há milhares de anos.

Em tempos mais recentes, novamente, áreas ao ar livre tem sido cada vez mais utilizadas para a configuração dessa chance de desenvolvimento pessoal e bem-estar através da imersão em ambientes naturais mais selvagens. 

Embora o termo “Terapia da Natureza Selvagem” seja um conceito relativamente novo na Europa e em outros continentes, ele existe nos EUA há muitos anos.

Múltiplas definições evoluíram à medida que o conceito ganhou popularidade, mas todas reconhecem os processos terapêuticos que são inerentes às expedições em ambiente selvagem (Peacock et al, 2008). 

Davis-Berman e Berman (1994) inicialmente definiram a Terapia da Natureza Selvagem como: “o uso de técnicas de terapia tradicionais, especialmente voltadas para terapias de grupo, em ambientes externos, utilizando atividades de aventura ao ar livre e outras atividades para o desenvolvimento do crescimento pessoal” (p. 13).

Oferecida por profissionais devidamente especializados da saúde mental, a Terapia da Natureza Selvagem é uma intervenção de tratamento emergente que usa uma abordagem sistemática para trabalhar em grande parte com adolescentes e pessoas vivenciando problemas comportamentais.

Os programas normalmente oferecem exercícios saudáveis ​​e dieta através de caminhadas e atividade física, sessões de terapia individual e em grupo, educacionais, habilidades primitivas, convivência em grupo com colegas, oportunidades para o trabalho individual e treinamentos de liderança e reflexão, assim como os desafios inerentes da vida nesses ambientes. 

A justificativa para as intervenções em ambientes naturais mais selvagens envolve separar os participantes das influências negativas diárias e colocá-los em ambientes externos seguros e organizados. 

Gastar tempo em um ambiente natural permite com que os participantes acessem aspectos de si mesmos que poderão guia-los em seus desenvolvimentos pessoais, alcançando novas configurações terapêuticas individuais.

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Os programas de TNS facilitam o autoconhecimento, a comunicação, a cooperação e a contribuição para o bem-estar do grupo, permitindo com que os participantes descubram o que consideram importante para si mesmos (Connor, 2007).

A participação na TNS também ajuda a lidar com comportamentos problemáticos, promovendo a responsabilidade pessoal e social, e proporcionando a oportunidade para o crescimento emocional (Russell, 1999).


Conteúdo traduzido e adaptado do documento: 

Referência: Sempik, J., Hine, R. and Wilcox, D. eds. Green Care: A Conceptual Framework, A Report of the Working Group on the Health Benefits of Green Care. COST Action 866, Green Care in Agriculture, Loughborough: Centre for Child and Family Research, Loughborough University. 2010

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