O impacto do desemprego na saúde mental das pessoas

Atualmente, o mundo inteiro vêm lidando com um grave problema: o desemprego. Segundo o economista Marcel Balassiano, da Fundação Getúlio Vargas, o indicador global de desemprego poderia subir 2.66 pontos percentuais na previsão feita para 2020.

O Indicador Coincidente de Desemprego (ICD) avançou 3 pontos em novembro e dezembro de 2020, alcançando o total de 102,6 pontos, o maior nível desde janeiro de 2017.

No Brasil, a quantidade de desempregados pode passar dos atuais 12,6 milhões para 15,6 milhões, cerca de oito a quinze por cento da população economicamente ativa do país.

O desemprego é resultado não apenas da ação individual do trabalhador, como também deve ser percebido como uma construção social, histórica e econômica, já que a origem do desemprego na sociedade está relacionada a leis objetivas do mercado, crises econômicas, reestruturação do capitalismo, mudanças no mundo do trabalho e das relações salariais, inovações tecnológicas, progressos nos modelos de gestão e transformações sociais, etc.

Sendo assim, as causas do desemprego estão além de problemas no indivíduo, mas se inter-relacionam com fatores macrossociais e históricos.

Guimarães (1998) propõe uma leitura do desemprego com base na perspectiva histórica dizendo que o que ocorre atualmente é consequência da expansão da produção sem um aumento significativo no número de empregos, delineando-se assim o desemprego como um problema estrutural, retirando de muitas pessoas o direito ao trabalho.

Para piorar, as previsões que os especialistas fazem é de que as taxas de desemprego tendem a ser cada vez maiores, já que ocorre na macroeconomia um processo de substituição da mão de obra humana pela aquisição de tecnologias sofisticadas (robôs e inteligencias artificiais, por exemplo) .

Assim, a economia mostra indícios de depender cada vez menos dos seres humanos para produzir os bens e serviços atuais do mercado.

A perda do emprego e suas consequências são objetos de estudo desde os anos 30, porém não houve uma profunda continuidade nos estudos que garantam uma análise objetiva de dados sobre o desemprego.

Os estudos até então desenvolvidos versam majoritariamente sobre a saúde mental do trabalhador e sobre como o trabalho influência na vida das pessoas.

Mas não podemos deixar de considerar, também, outro objeto de estudo de fundamental importância para a contemporaneidade: o desempregado, aquele que vivência a falta de renda e a exclusão do mundo trabalho.

Os estudos até então desenvolvidos demonstram que as consequências do desemprego não se limitam apenas aos fatores econômicos (Blanch, 2001), como também se estendem para fatores sociais e familiares.

Vê-se que as consequências adversas do desemprego podem acarretar a desestruturação de laços sociais e afetivos, a restrição de direitos, a insegurança socioeconômica, a redução da auto-estima, o sentimento de solidão e fracasso, o desenvolvimento de distúrbios mentais e o aumento do consumo ou dependência de drogas.

As autoras Rocha, Carvalho e Barreto (1999) destacam os principais impactos do desemprego como vivências depressivas, desânimo, pensamentos suicidas, tensão, insegurança, insônia, dores generalizada, mau humor e brigas familiares mais frequentes.

Segundo os estudos apontam, uma grande parte dos trabalhadores tem no trabalho o único elo social fora do convívio familiar e, nessa perspectiva, torna-se essencial refletirmos sobre a situação que o trabalhador se encontra ao ser excluído do meio de trabalho.

Quais consequências isso pode ocasionar na saúde mental?

Qual o valor do trabalho na nossa sociedade?

O fato de não trabalhar, leva o indivíduo a enfrentar um processo de desvalorização social; pois, segundo Lima e Borges (2002) “as reações do desempregado à sua condição não são fruto apenas das perdas materiais que sofreu, mas, sim, da impossibilidade de expressar-se, desenvolver-se e deixar sua marca no mundo.”

Ou seja, sem trabalho o sujeito tem a sua capacidade de atuação limitada. Além disso, segundo os estudos de Grisi (2000), além da importância social, o trabalho é representado na vida do indivíduo como um dos mecanismos de subjetivação do sujeito. Portanto, retirar esse direito da vida de um indivíduo é excluir parte de sua identidade.

Como exemplo disso temos o caso da Grécia, que passou por uma crise social devido às políticas de austeridade impostas pela União Europeia, desencadeando uma série de desempregos no país.

O desemprego atingiu 30% da população ativa na Grécia e, apesar disso, os impostos foram aumentados para diminuir o deficit econômico do país.

Porém, as consequências que essas ações geraram foram drásticas para a comunidade. Entre os moradores de Atenas, por exemplo, ela teria provocado um aumento significativo no consumo de psicotrópicos, de ansiolíticos à base de benzodiazepínicos e de antidepressivos.

Pesquisadores da Universidade Nacional Capodistriana de Atenas estudaram metodicamente as manifestações dessa “angústia cotidiana” descrita pelo primeiro-ministro Alexis Tsipras.

A cada semana, de 2010 a 2014, Nikolaos Thomaidis e seus colegas recolheram amostras nas estações de esgoto da capital grega, que coletam as águas rejeitadas por mais de um terço da população da Grécia, ou seja, 3,7 milhões de habitantes.

Eles encontraram 148 medicamentos narcóticos e outras substâncias ilícitas, assim como seus metabólitos – os produtos de sua transformação no organismo.

Ao mesmo tempo, a equipe de Thomaidis destaca a duplicação dos níveis de metanfetaminas ilícitas (drogas psicoestimulantes, muito viciantes, neurotóxicas, chamadas speed, meth ou crystal meth).

Para Thomaidis, esses resultados sugerem que a saúde da população na Grécia, em particular a saúde mental, se deteriorou fortemente ao longo desse período.

Assim, fica nítida a necessidade de enfrentar a problemática do desemprego!

A pesquisadora Grisi concluiu que havia consciência, por parte dos desempregados sobre a importância da manutenção da saúde para lidar com a situação de desemprego e, uma vez que existe relação entre o bem-estar mental e o aumento das chances de se reempregar, é de extrema importância o sujeito passar por um acompanhamento psicoterapêutico profissional para enfrentar o problema.

Os principais sentimentos descritos relacionados à situação foram: angústia, insegurança, incerteza, raiva, frustração, desmotivação, preocupação e irritação.

Portanto, é fundamental que o indivíduo que procura por emprego a muito tempo procure por ajuda de profissionais da área da saúde mental para poder lidar com tais sentimentos desafiadores.

Porém, por uma outra perspectiva, Moura (2001) ressalta que a perda do emprego possibilitou que muitas pessoas pudessem buscar novas oportunidades em suas visas, sendo uma etapa muito importante de reconstrução e ressignificação.

De qualquer maneira, o desemprego ainda é um problema social que requer muito cuidado, estudo e auxílio para a sua superação.

O que os especialistas recomendam para enfrentar tais problemas é o investimento pesado em educação especializada, pois em um cenário cada vez mais competitivo, no qual temos que competir entre seres humanos e máquinas, somente os postos de trabalho que requerem maiores especializações vão permanecer no mercado de trabalho.

Além disso, toda a forma de atividade e produção criativa deve ser estimulada e desenvolvida para o mercado de trabalho, porque, até então, não existe nenhum robô ou inteligência artificial que consiga fazer o trabalho criativo do ser humano.

Referências:

  SOUTO, Letícia & MONTEIRO, Jenine – Refletindo sobre desemprego e agravos à saúde mental – Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 2007, vol. 10, n. 2, pp. 35~45

GUIMARÃES, J.L. (1998) – Globalização, desemprego e educação – Vertentes, 4, 125~144

BLANCH, J.M. (2001) – Sin y subempleo: nuevas fuentes de malestar y de exclusion social – In E. Aguilló C.Remenseiro & J.A Fernández (Orgs.) – Psicologia del trabajo, de las organizaciones y de los recursos humanos (pp. 208-211) – Madri: Biblioteca Nueva.

ROCHA, L., CARVALHO, M. & BARRETO, M. (Orgs.) (1999) – Impactos do desemprego na saúde de homens e mulheres – São Paulo: UBM.

LIMA, M. E. A. & BORGES, A. F. (2002) – Impactos psicossociais do desemprego de longa duração – In I. B. Goulart (Org.) – Psicologia organizacional e do trabalho: teoria, pesquisa e temas correlatos. São Paulo: Casa do Psicólogo.

GRISI, C. (2000) – Trabalho, tempo e subjetividade: a reestruturação do trabalho bancário – Tese de Doutorado, Instituto de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

MOURA, E. P. G. (2001) – Subjetividade e desemprego – Expressão Psi, 5 (1), 61-79.

Nikolaos S. Thomaidis et al., “Reflection of socioeconomic changes in wastewater: licit and illicit drug use patterns” [Reflexo das mudanças econômicas em águas residuais: padrões de uso de drogas lícitas e ilícitas], Environmental Science and Technology, v.50, n.18, Sociedade Norte-Americana de Química, Washington, DC, 2016.

A austeridade deteriora a saúde mental dos gregos – Le Monde Diplomatique

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *