Localizados em diferentes cidades do Brasil, servindo como uma extensão da atenção básica para pessoas em situação de rua com maiores dificuldade de acesso à saúde básica, os consultórios na rua buscam salvar a vida de milhares de pessoas todos os dias.
Seja por meio dos cuidados prestados ou por meio da conscientização e humanização inerentes ao contato, essa difícil missão fica a cargo de equipes multidisciplinares, formadas por profissionais de diferentes áreas da saúde, que compõem a estrutura e as ações do Consultório na Rua.
Como estratégia de cunho itinerante, os atendimentos são prestados nas bases médicas sob rodas espalhadas por territórios previamente escolhidos de acordo com análises feitas a respeito das populações neles presentes. Um trabalho humano, significativo e efetivo, no cuidado às pessoas em situação de rua.
Vale a pena acompanhar e conhecer!
A estratégia do Consultório na Rua e a história por trás de seu surgimento
Há muitos anos, essencialmente em cidades de maior tamanho e número de habitantes, cresce a população em situação de rua. São pessoas – cidadãs – renegadas das estruturas e do ideário sociais, fadadas a um tipo de vivência difícil e morando em pleno espaço urbano, por diversos motivos.
No Brasil, até a década de 80, o Estado não se responsabilizava por criar estratégias de acolhimento, cuidado e outras possibilidades de vida para essas pessoas. Foi necessária a luta incessante de movimentos sociais e o aumento brusco da precariedade dessas vidas para que algo, de fato, pudesse ser feito.
A instituição da Política Nacional para a População em Situação de Rua seria a primeira política expressiva a emitir luz sobre essa temática, regulamentando o acesso à assistência pública aos moradores de rua, dentro das políticas sociais e de saúde, como algo formatado em direito.
Passados dois anos deste evento (2011), então como estratégia de saúde pública de cuidado e de iniciativa à saída das ruas às populações marginalizadas, em nova edição da Política Nacional de Atenção Básica, cria-se a estrutura e formam-se também as primeiras equipes dos primeiros Consultórios na Rua.
Baseando-se na ação fora dos serviços de saúde, a estratégia dos consultórios resulta no deslocamento de profissionais da saúde para esses ambientes, fomentando novas formas de contato humanizado, de tratamentos e de escuta em relação ao outro, de maneira a atender as demandas e processos das pessoas vivendo nesses espaços.
Quer ler mais sobre outros temas interessantes da Saúde Mental? A gente deixa o link pra você!
Nesse sentido, o Consultório na Rua deve seu sucesso à competência e insistência desses profissionais, em construir essas novas formas de cuidado e contato, muitas vezes transpondo barreiras institucionais do próprio sistema de saúde e da ausência de articulação setorial entre as políticas públicas estaduais (Rosa e de Santana, 2018).
Atualmente, a atuação desses profissionais em conjunto com as estratégias do programa ainda são necessárias, pois ainda há um longo caminho a ser percorrido para que se alcance o bem estar geral dessas pessoas, e fora das ruas. Ainda batalha-se por isso e o atingir desse objetivo seria uma grande e histórica conquista.
Entendendo como agem e quais princípios seguem os Consultórios na Rua
1) As atividades em equipe dos Consultórios na Rua
É importante saber que a multidisciplinariedade caracteriza o trabalho realizado pelas equipes dos consultórios, algo estruturado sob configurações bastante heterogêneas em um bom sentido, contando com a presença de profissionais de diferentes áreas da saúde.
Para a realização das atividades, as equipes dispõem de uma base de saúde móvel, servindo tanto como meio de deslocamento para elas quanto para o envio e transporte de medicamentos e materiais necessários para os atendimentos.
Cada atuação pressupõe reuniões da equipe, análises acerca de determinadas situações de trabalho e território, sempre em função das melhores tomadas de decisão e de execuções bem feitas de qualquer trabalho médico/terapêutico a ser realizado. Atividades noturnas também são planejadas e colocadas em prática.
O sentido de pertencimento que emana do fenômeno de grupo é claramente destacado por meio de uma práxis que entende que cada um tem um olhar diferenciado e saberes plurais para vasculhar em diferentes áreas do conhecimento (Silva, Frazão e Linhares, 2014).
2) A valorização da construção do vínculo
Outro elemento imprescindível de todo trabalho realizado com a população em situação de rua é a construção de vínculos por meio do diálogo, dos cuidados e da escuta atenta das demandas existentes entre as pessoas atendidas.
Para tanto, além do diálogo e da escuta, oficinas artísticas envolvendo o uso da música, da pintura, dos desenhos, da dança e de outras atividades dirigidas, são utilizadas quando possíveis.
Nesse sentido, as equipes reconhecem que essas atividades realizadas na rua permitem com que os atendidos sintam-se mais à vontade para a participação e construção desse relacionamento proveitoso, como uma via de mão dupla em termos de aprendizado e conhecimento.
Em suma, as ações de saúde realizadas no cotidiano de trabalho das equipes buscam identificar as demandas dos moradores da rua numa abordagem integral e articulada à rede básica de saúde (Silva, Frazão e Linhares, 2014) e a outros aparatos agregadores da atenção básica.
3) A educação em saúde como estratégia na redução de danos
A conscientização por meio da educação surge, mais uma vez, como ferramenta de libertação e cuidado dentro dos relacionamentos estabelecidos entre profissionais e atendidos, conforme as estratégias elaboradas de acordo com os princípios do Consultório na Rua.
As equipes reconhecem que as pessoas em situação de rua não dispõem de saúde, de acesso à educação e dos direitos que deveriam ter por uma cidadania levada a sério, portanto, se propõem a ser um elo entre a rua, o ensino/aprendizado e a própria saúde.
Quer ler mais sobre outros temas interessantes da Saúde Mental? A gente deixa o link pra você!
Sendo assim, levar os sujeitos a refletirem sobre suas vidas, condições e possibilidades, é dar espaço também para que a redução de danos surja nesse relacionamento entre profissionais da saúde e pessoas vivendo nas ruas.
Conversar sobre as medicações, ensinar sobre os efeitos do álcool e das drogas no organismo e explicar sobre a necessidade existente de que se cuide da própria saúde antes de qualquer próximo passo, acabam fazendo parte da estratégia utilizada pelas equipes.
4) Desafios de atuação dos Consultórios na Rua
Dentre os principais desafios de atuação dos Consultórios na Rua, está o estigma social que circunda a situação de quem vive nas ruas e acaba prejudicando ainda mais o acesso dessas pessoas a serviços de saúde básicos.
A falta de documentação e a burocracia encontrada nos serviços são barreiras a se lidar pelos profissionais e usuários morando nas ruas da mesma forma.
A questão do preconceito é latente. Seja entre os profissionais, que são postos a teste quando desempenham pelas primeiras vezes esses tipos de atendimento, seja pelos próprios moradores, que olham para suas condições como indignas de respeito ou atenção.
A recorrência das drogas, a desistência de tratamentos por parte de alguns dos atendidos nas ruas e outras problemáticas, podem surgir e constituírem questões a serem entendidas e enfrentadas pela equipe e a pessoa em voga, caso seja essa a demanda.
Ajudar quem têm necessidades torna-se sempre o objetivo final de todos os atendimentos.
(Modelo de divisão adaptado do conteúdo de Rosa, Frazão e Linhares, exibido em artigo publicado no ano de 2014)
O Consultório na Rua como política de inclusão social – Considerações Finais
A proposta do Consultório na Rua, bem como descrito nos parágrafos acima, surge como meio de ampliar o acesso à saúde básica às pessoas vivendo nas ruas, estas, que marginalizadas por diferentes motivos, não o teriam (o acesso) de maneira digna e a serviços de qualidade.
Constitui-se como um programa de garantia de direitos a essas pessoas, ao ponto em que também quebra estigmas dos mais diversos, seja na desconstrução da relação hierárquica entre profissional e atendido – em todos os momentos, vistos como iguais dotados de conhecimentos diferentes –, seja na possibilidade do contato com um bom atendimento.
Entender o espaço da rua não como um lugar de passagem, visualizando-o como território e como lugar de permanências e ausências, dá tom aos trabalhos realizados e permite olhar para as pessoas morando nela como gente, como seres humanos precisando de um apoio que poucos pensam em dar.
Nesse sentido, para além do encontro acolhedor, pensa-se em criar possibilidades para que se rompa com a invisibilidade inerente às condições de rua, permitindo com que o morador possa participar novamente, e de maneira integral – não como um problema urbano –, da sociedade, e que ajude a romper preconceitos e estigmas.
Sendo assim, é importante que os profissionais de saúde acolham o morador de rua como sujeito de direitos e como um indivíduo portador de uma trajetória de vida singular, como o acontece.
Conhecer os territórios, as dinâmicas de vidas e as suas práticas de transgressão é parte de um processo de abertura para o “outro” e o caminho para a desconstrução do olhar estigmatizante e colonizador (Hallais e Barros, 2015).
Quer ler mais sobre outros temas interessantes da Saúde Mental? A gente deixa o link pra você!
Link permanente
Olá Pietro Navarro!
Muito interessante a proposta Consultório na Rua. Uma possibilidade maravilhosa para quem vive em situação de risco e sem acesso a uma boa equipe de atendimento multidisciplinar em consultórios convencionais. Parabéns!
Link permanente
Bom dia, Adriane, e muito obrigado!
Realmente, um trabalho incrível, de muito esforço, e que necessita de maior respaldo. Um grande abraço!
Link permanente
Bom diaaaa Pietro.
Amei saber que este tipo de ação em algum lugar já está sendo realizada. Desde a época acadêmica que sempre me inquietou a falta de aproximação da psicologia com a comunidade em sua totalidade. Parabéns pela sua iniciativa de compartilhar todo seu conhecimento.
Link permanente
Bom dia, Alexsandra! Tudo bem com você?
Te agradeço pelo carinho e pelas palavras. Além dos Consultórios, que são fundamentais para essa aproximação, outras estratégias existem com esse mesmo fim. Nosso próximo post será sobre as estratégias de matriciamento. Provavelmente você irá gostar também. Mais uma vez, muito obrigado!!
Link permanente
Nossa! Quanta admiração e respeito por esse maravilhoso trabalho. Como seria bom se todos os municípios pudesse oferecer essa aproximação para esses indivíduos tão vulneráveis. Só tenho que dizer meus parabéns por uma bela iniciativa.
Link permanente
Muito bom esse trabalho que essa equipe multidisciplinar criou .pra ajudar as pessoas que vivem situação de
Rua .gostaria de saber se tem aqui no meu estádo .esse tipo de ação mora em Belém do Pará
Link permanente
Olá, vi a matéria e gostaria de emplanta na minha cidade pois a cada dia vejo o aumento de pessoas carentes de atenção e cuidado
Sou de Araruama Rj
Obrigado pela atenção
Link permanente
olá, faço parte da equipe do consultório na rua, sou nova por aqui , sou tsb, e gostaria de trocar ideias com outro tbs de outro estado…se alguém estiver interessado . Selma leandro