As abordagens da Saúde Mental de aplicação prática na Atenção Básica

Ao longo dos anos, os cuidados na atenção básica foram sendo ampliados para abarcar um número cada vez maior de cidadãos, mas de forma organizada e bem estruturada entre seus diversos serviços.

A saúde mental entrou logo no início desse processo de expansão e hoje está integrada aos serviços realizados em Unidades Básicas de Saúde, dentre aqueles organizados pelos Projetos de Saúde da Família e alguns outros de fundamental importância.

As novas abordagens da saúde mental foram essenciais para que uma mentalidade ultrapassada fosse desconstruída e substituída por outra, inerente a essas novas abordagens, que olhasse para a pessoa como um ser humano, cheio de vida e história, merecedor de um bom tratamento e de bons cuidados.

Ainda se tem um longo caminho para ser percorrido no que tange a essa união entre atenção básica e saúde mental, mas caminhamos bastante em algum tempo e não por acaso. As abordagens da saúde mental, por exemplo, serviram de ferramenta para muitos avanços e será sobre elas que nós iremos falar hoje.

A saúde mental como componente dos atendimentos na atenção básica

Em primeiro lugar, é importante saber que a atenção básica tem como um de seus princípios fundamentais o possibilitar do primeiro acesso de diversas pessoas ao sistema público de saúde, inclusive daquelas que necessitam de cuidados em saúde mental.

Nos programas organizados por meio da atenção básica, profissionais de diferentes áreas da saúde são requisitados para trabalharem juntos em função do bem estar do indivíduo em sofrimento, sendo essa união o elemento a dar tom as ações a serem desenvolvidas.

Entre os elementos fundamentais desses programas, e isso também em relação a saúde mental, está a aquisição de conhecimento a respeito dos contextos de cada um a ser acompanhado, algo que surge como uma responsabilidade dos grupos responsáveis pela realização de cada atendimento.

Desde conhecer onde ela mora, até o conhecer de seu núcleo familiar, tudo pode fazer uma grande diferença no descobrimento das causas e consequências dos problemas enfrentados pela pessoa em questão.

O acolhimento na atenção básica também assume posição como outro dos elementos essenciais de cada tratamento. A criação de vínculos entre os profissionais e a pessoa sendo atendida, muitas vezes até diariamente, tem impactos enormes no processo de recuperação e deve estar presente a todo momento como algo extremamente importante.

Algumas das ações terapêuticas mais comuns entre os profissionais da atenção básica, quando não psicólogos ou terapeutas, baseiam-se na criação de espaços para comunicação, no desenvolvimento de empatia, nas escutas atentas, no entender das condições de cada atendido e na estruturação de atendimentos criadores de autonomia e independência.

As intervenções em saúde mental, nesse sentido, devem promover novas possibilidades de modificar e qualificar as condições e modos de vida de cada um, orientando-se pela produção de vida e de saúde, e não se restringindo à cura de doenças. Isso significa acreditar que a vida pode ter várias formas de ser percebida, experimentada e vivida.

A congregação dos diferentes aparatos, organizações e instituições presentes na atenção básica torna-se também um pré-requisito dos atendimentos em saúde mental. É um amparo que funciona para todos, e assim o é aplicado também nos casos de sofrimento psíquico.

Dificuldades historicamente enfrentadas pelos profissionais da atenção básica nos cuidados à saúde mental

Historicamente, dado que a união entre as políticas de saúde mental e atenção básica não existiam, a maior parte dos profissionais da saúde pública formavam-se orientados a combaterem doenças, e não necessariamente a produzirem capacidades analíticas que os permitissem enxergar a pessoa e seu contexto como um causador de problemas.

Por essa razão – dentre outras, como a grande demanda existente de atendimentos na AB –, muitas das ações a surgirem na atenção básica acerca de como lidar com os casos de saúde mental, buscariam apenas acabar com alguns dos sintomas expostos pelas pessoas – leigas em sua maioria – e não necessariamente conhecer suas verdadeiras causas e origens.

Alguns profissionais, por exemplo, sentir-se-iam culpados por pensarem realizar atendimentos de pouca qualidade ao entrarem em contato com esta nova forma de conceber os cuidados em saúde e saúde mental. Essa situação, felizmente, se atenuaria com o tempo, construídas novas aberturas para novas reflexões dentro dos meios.

A proximidade com a pessoa, com sua dor e seu contexto de vida; a criação de vínculos e a mudança de um modelo de pensamento pouco voltado para as causas reais de problemas apresentados; tudo isso auxiliou e tem auxiliado na construção desses novos processos de cuidado e na fortificação de novas estruturas de atendimento ao longo dos anos.

Dentre os casos mais comuns de saúde mental na atenção básica, encontram-se, mesmo hoje, variados de tristeza aguda, de ansiedade intensa, de insônia, medo frequente, e mesmo de dores físicas como somatória dessa lista de sintomas de natureza psicológica.

A saber, instabilidade familiar, problemas com álcool e drogas, episódios traumáticos e a pobreza em geral estariam associados ao aparecimento desses casos e na busca por ajuda nos tratamentos oferecidos por meio da AB.

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A carga emocional dos atendimentos, nesse sentido, torna-se algo a ser trabalhado também pelos profissionais, e espaços com esse fim – que podem ser conversas, reuniões, diálogos simples do dia-a-dia – surgem cada vez mais naturalmente nesses ambientes e instituições. A união da equipe em torno dos casos é um grande exemplo disso.

O existir desses questionamentos e dificuldades acerca da relação atenção básica e saúde mental se da de forma natural e é importante que os profissionais tomem essa consciência, não sofram e trabalhem pra alterar essa realidade existente.

Em suma, a reflexão e o diálogo tornam-se não só ferramentas de auxilio ao lidar com sentimentos estranhos por parte dos profissionais, como também se tornam ferramentas essenciais aos próprios tratamentos, buscando melhorar a qualidade de vida das pessoas e o reconhecimento pleno da origem de suas dificuldades psicológicas.

As abordagens da saúde mental de aplicação prática na atenção básica

Os instrumentos e abordagens de intervenção psicossocial na atenção básica constituem-se em importante estratégia para produção do cuidado em saúde. Com uma oferta de tecnologias que contemplem necessidades e demandas que surgem do território, são ações em saúde mental para atenção básica que dialogam com o conceito ampliado de saúde e com a integralidade do cuidado (Ministério da Saúde, 2013).

Grupos de Apoio

Desde que bem idealizada sua finalidade, estrutura e meios de administração, o grupo de apoio pode proporcionar às pessoas que dele fazem parte experiências transformadoras em conjunto com os métodos da Terapia Comunitária (TC).

Isto se deve à pluralidade de seus integrantes, à diversidade de trocas de conhecimentos nesses ambientes e às possíveis identificações e contato humano que apenas um grupo torna possível; algo que atendimentos de tipo individualizado não conseguiriam alcançar.

A subjetividade dos relacionamentos entre os membros, a forma como um ajuda no processo de recuperação do outro, seja por meio de falas ou pela empatia gerada em relação a vivência do outro; esse trabalho terapêutico só existe por conta de e em meios como os dos grupos de apoio.

Reatribuição de sintomas somáticos sem explicação médica

Muitas pessoas chegam aos serviços da Atenção Básica com queixas de sintomas físicos para os quais não encontramos explicação médica. Essas reclamações podem ser muito persistentes, de forma que levam a equipe a um esforço grande para detectar qual patologia existe por trás do quadro sintomático.

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Não havendo evidência clínica de que o sujeito está com algum problema real, o que talvez exista por trás de tais queixas seja um sofrimento muito grande. E a pessoa que sofre não esteja conseguindo associar a sua situação de sofrimento aos sintomas que está produzindo.

Nesse contexto, reatribuir significa fazer a relação entre as queixas sintomáticas e o sofrimento psíquico. Atribuir o sintoma a um sofrimento que pode não ter sua origem no corpo e dar ao sofrimento o cuidado que ele demanda.

Rede de Suporte Social

A rede de suporte social ganha concretude na medida em que se estabelecem espaços permanentes e periódicos de encontros e discussões entre as equipes de Atenção Básica, demais equipes de saúde e de outros serviços do território.

Busca-se fortalecer por meio dela a rede de apoio às pessoas em necessidade, incluindo necessidades psicossociais, de modo a ampliar o alcance de tratamentos, a resolutividade de problemas, o fomento da atenção integral e, por consequência, a melhora na qualidade do cuidado prestado.

Para tanto, toda a rede mapeada durante o processo de diagnóstico do território (CAPS, NASF, ESF, Cras, Creas, equipamentos de educação, organizações da sociedade civil, entre outros) deve ser incluída nestes espaços coletivos sempre que possível.

PICS (Práticas Integrativas e Complementares)

O campo das Práticas Integrativas e Complementares (PICs) contempla sistemas médicos complexos e recursos terapêuticos que envolvem abordagens que buscam estimular os mecanismos naturais de prevenção de agravos e recuperação da saúde por meio de práticas eficazes e seguras.

Estas práticas compartilham um entendimento diferenciado sobre o processo saúde-doença, ampliando a visão desse processo e as possibilidades terapêuticas, contribuindo para a promoção global do cuidado humano, especialmente do autocuidado (Brasil, 2006).

São exemplos de Práticas Integrativas e Complementares: Medicina Tradicional Chinesa, Acupuntura, Homeopatia, Plantas Medicinais, Fitoterapia, Medicina Antroposófica e diversas outras.

Terapia Comunitária

A Terapia Comunitária (TC) caracteriza-se como mais uma ferramenta à disposição dos profissionais da atenção básica no campo da saúde mental a ser utilizada no território de atuação. A atividade organiza-se como um espaço comunitário que possibilita a troca de experiências e de sabedorias de vida.

A TC visa trabalhar de forma horizontal e circular ao propor que cada um que participe da sessão seja corresponsável no processo terapêutico que se realiza naquele momento e que produz efeitos tanto grupais quanto singulares.

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A partir da apresentação das pessoas, exposição das regras da TC e da escolha do tema do dia, as pessoas relatam suas histórias pessoais e o grupo participa da discussão com perguntas e falas que objetivem a superação das dificuldades do dia a dia – tudo em um clima acolhedor e de empatia.

O compartilhamento de vida produz a relação entre os sujeitos, que podem se reconhecer como figuras de apoio mútuo.

Terapia Cognitiva Comportamental

Em geral, pessoas passando por um grau elevado de sofrimento psicológico muitas vezes deixam de fazer atividades que lhes davam prazer, e  gradativamente, ao mesmo tempo em que ele aumenta, essas atividades tornam-se cada vez menos presentes em suas vidas. 

Ações simples como passear, ir ao parque, cuidar do jardim, cozinhar, fazer esporte, ler, entre outras, são abandonadas, retiradas da rotina da pessoa.

Chama-se de Terapia Cognitiva Comportamental (TCC) de ativação essa forma de cuidado que incentiva e apoia a retomada das atividades que oferecem qualquer tipo de satisfação à pessoa.

Conversar sobre a importância desse tipo de atividade é uma forma de cuidado que o profissional de saúde na atenção básica pode proporcionar à pessoa que está lidando com algum tipo de sofrimento psíquico.

Mediação de Conflitos

Situações de conflito familiar ou grupal estão entre as principais demandas do profissional ou do serviço da atenção básica. Para esse tipo de quadro, a mediação de conflito envolve a capacidade de transformar conhecimentos, habilidades e atitudes em resultados práticos.

Ao profissional, cuja prática pressupõe um vínculo mais próximo com a pessoa, cabe muitas vezes mediar situações de conflito e assumir um papel de agente, adotando estratégias que contribuem para a resolução de um dado conflito.

Muitas vezes essas intervenções dependem da adoção de algumas técnicas simples – como o diálogo guiado – e de conhecimentos práticos que facilitem a condução dessas situações, contribuindo de diferentes formas para resolução do problema.

O conflito familiar está frequentemente associado a situações de estresse e descompasso psíquico, podendo ser a origem de problemas apresentados por diferentes pessoas na rede de saúde que proporciona a atenção básica.

Terapia Interpessoal Breve

Entende-se a TIB como uma técnica de abordagem para a diminuição dos problemas associados ao uso de substâncias em que o principal objetivo é identificar o problema e motivar a pessoa a alcançar determinadas metas estabelecidas em parceria com o profissional de saúde.

A identificação e dimensionamento dos problemas ou dos riscos une-se ao oferecimento de aconselhamento, orientação e, em algumas situações, monitoramento periódico do sucesso em atingir as metas assumidas pela pessoa.

A família assume um papel fundamental nesses casos, conforme o apoio que concede ao ente querido e a compreensão que demonstra diante do quadro e da situação pela qual passa em decorrência da presença do álcool ou das drogas nas questões de mérito familiar.


Fonte: Ministério da Saúde, 2013

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6 Comentários


  1. Temos ferramentas para contribuir cada vez mais com a práticas das nossas políticas públicas e continuar construíndo rumo ao melhor para todos sempre. Imprescindível essas informações através desse excelente trabalho.
    Parabéns a todos envolvidos.

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