Desde muitos anos antes de concebermos música como a concebemos nos dias de hoje, ela já fazia parte do cotidiano do ser humano de diferentes formas.
O tempo passou, conceitos de música foram criados, as notas e melodias, os tipos de sonoridade e tantas outras variantes. Da religiosidade em formato musical, que dava tom as cerimônias mais antigas, ás profissões da música, ela nunca teria deixado de existir.
Uma delas, seu uso enquanto terapia, surge de acordo com as qualidades que somente ela tem, seja para nos deixar felizes ou tristes, de mexer com os nossos ânimos e de alterar as estruturas física e psicológicas do homem.
Dos ritmos mais arcaicos, dos primeiros sons emitidos e escutados, a música que nos rodeia deixa marcas em nós. Marca um momento, muda um humor, dá tom as coisas em nossa volta.
A musicoterapia tem esse fim quando relacionada a saúde mental: mudar para melhor, através de sons e do contato com instrumentos, a vida e a capacidade das pessoas que entram em contato com ela.
Conheça um pouco mais sobre a musicoterapia…
A Música como terapia e seu uso ao longo da história
De acordo com Padilha (2008), desde o Egito Antigo já se utilizava da música como agente curador, cuja finalidade seria a de restabelecer e reabilitar enfermos sob o sofrimento de problemas tanto físicos quanto psíquicos e emocionais.
Na cultura indígena de diferentes países acreditava-se que as enfermidades surgiam em decorrência da má influência de espíritos malignos ás pessoas da comunidade, sendo o Xamã requisitado para a utilização de sons e canções que tinham como objetivo apaziguar, conquistar ou mesmo intimidar seus causadores (Zanini, 2004).
Mas teria sido na Grécia Antiga a formação dos primeiros estudos mais aprofundados sobre o impacto da música no bem estar do ser humano. Platão, por exemplo, receitava música e dança para os medos e as angústias fóbicas existentes naqueles que os procuravam.
Aristóteles, outro grande filósofo grego, falava sobre o valor apaziguante da música em relação às emoções incontroláveis e atribuía seu efeito à elevação emocional propiciada pelos efeitos do som.
E Hipócrates, descrito como o pai da medicina ocidental, considerando que a doença implicaria na desarmonia da natureza humana, apontava também para a música, que por ser a ordem e a harmonia dos sons, surgiria como um dos elementos essenciais a restabelecer o equilíbrio perdido em função da cura.
Pouco a pouco, a música iria sendo incorporada pelas instituições de ensino medievais e modernas em seus currículos, fazendo da ciência algo mais próximo dela e assim, consequentemente, da saúde também.
Dando um pequeno salto no tempo, em direção ao século XVII, a música torna-se também recomendada pela medicina da época.
Um médico, Robert Burton, em sua obra “Anatomia da Melancolia” (1632), descreveria os efeitos terapêuticos da música sobre aqueles considerados melancólicos (Zanini, 2004).
No século XIX, Philippe Pinel, considerado como o precursor da psiquiatria por ter sido o primeiro a realizar estudos sobre a esquizofrenia e a demência, assim como um dos primeiros médicos a tratar dos enfermos mentais como necessitados ao invés de violenta-los em decorrência de suas crises, seria um grande contribuinte da ideia de música como tratamento.
Defendendo que pacientes psiquiátricos deveriam receber tratamentos humanizados, Pinel incluía a música – doce e harmoniosa – em suas abordagens, como forma de acalmar seus atendidos, procurando faze-los melhorar em conjunto com outras de suas técnicas.
A Musicoterapia enquanto ciência
O uso da música como um instrumento terapêutico, como foi dito acima, surge nas práticas tribais do xamanismo, quando o Xamã era chamado para espantar espíritos malignos, sendo um de seus métodos a utilização dos sons.
Para além desse tipo de uso, outras duas vertentes importantes da musicoterapia tiveram reconhecida importância para a sua história, permitindo o desenvolvimento de novas práticas musicais em diferentes contextos, com diferentes finalidades, dando a ela o teor de uma ciência com o passar do tempo.
Uma delas ficaria bastante conhecida por conta de Émile Jaques-Dalcroze, que por meio do uso da música como forma de comunicação, expressão e entendimento, criaria um método revolucionário de pedagogia e forma de ensinar ao outro: a Educação Musical.
Dalcroze teria rompido com o tradicionalismo religioso medieval, que ao ensinar, faria uso da música apenas como um conceito e uma forma de entender padrões matemáticos universais, sem propor sua utilização como maneira de se conectar e conhecer a relação entre a mente e o próprio corpo.
A segunda vertente surgiria nos Estados Unidos, no pós-guerra, sob o nome de Recreação Musical. Contratavam-se músicos para fazerem concertos aos veteranos de guerra presentes nos hospitais e enfermarias americanas, buscando melhorar sua saúde e qualidade de vida.
Os resultados positivos de algumas dessas experiências atraíram o interesse dos médicos e se compreendeu na época, cada vez mais, a necessidade de um treinamento específico para fazer do músico um terapeuta.
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Assim, a partir de 1950, começam a surgir cursos de formação em musicoterapia em vários países (Zanini, 2004, apud Benenzon, 1985).
Desde então, a musicoterapia emerge como ciência, originária de uma longa história envolvendo diferentes sonoridades, o ser humano, o meio em que se vive e as inúmeras relações existentes entre ela e outras ciências complementares, principalmente as vinculadas à saúde física e mental das pessoas.
A Musicoterapia enquanto profissão e as áreas de atuação do musicoterapeuta
O curso de musicoterapia tem como um de seus princípios fundamentais a interdisciplinaridade. A formação do musicoterapeuta está baseada em três grandes áreas de estudo que dão base a essa lógica: a musical, a científica e a da sensibilidade.
A área musical busca o desenvolver das habilidades musicais do profissional terapeuta em relação ao seu fazer musical, dando ênfase igualmente aos conhecimentos teóricos e históricos da pessoa sobre música e seus elementos.
A área científica diz respeito ao estudo biológico, psicológico e social do ser humano, de forma a entender suas reações a música, seus comportamentos internos e externos, assim como as dificuldades e patologias do corpo e da mente humana.
E a área sensível trata da interação entre os sons emitidos pela música com o corpo, da consciência e a reflexão que se deve ter sobre o contato corporal com o outro e de como isso se desenvolve no contexto terapêutico.
Todos os conhecimentos citados são imprescindíveis para que o musicoterapeuta possa fazer estudos interdisciplinares, utilizando, por exemplo, conhecimentos de neurologia, psicologia e psicoacústica para melhor entender o comportamento e o funcionamento cerebral daqueles com que tem contato (Zanini, 2004).
Afirma-se que pelo fato da música envolver e afetar muitas facetas do ser humano, e em função da grande diversidade de suas aplicações, a musicoterapia pode ser utilizada para se obter um grande espectro de mudanças terapêuticas nas pessoas (Zanini, 2004, apud Bruscia, 2000).
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Nessa perspectiva, o musicoterapeuta, assim como outros profissionais trabalhando em função da resolução de problemas e dificuldades presentes nas pessoas que procuram serviços da saúde mental, deve fazer parte das equipes multidisciplinares que se propõem a atingir esse tipo de objetivo.
Dada sua formação plural, o profissional da musicoterapia, agindo tanto de forma preventiva quanto de forma resolutiva, pode atuar em diversas áreas e estabelecimentos, sendo eles:
1) Hospitais (em suas diversas áreas)
2) Comunidades (área social: com menores carentes ou infratores, presídios, etc)
3) Ensino (com educação e/ou educação especial)
4) Pesquisa (como professores de ensino superior e pesquisadores)
5) Reabilitação motora (o movimento do corpo de acordo com a música)
6) Idosos (melhoria da qualidade de vida, memória, socialização, autoestima)
A saúde mental e a música como instrumento terapêutico
A introdução da música no âmbito da saúde mental começa de acordo com a reforma psiquiátrica e os princípios éticos, médicos e sociais que se instaurariam na sociedade brasileira em decorrência dela.
Não segregar mais aqueles em enfermidade mental seria um grande passo para esse processo, abrindo portas para a criação de serviços e abordagens totalmente distintas das utilizadas anteriormente, por exemplo, pelos hospitais psiquiátricos.
A musicoterapia nesse sentido surge como uma forma desprovida de críticas e preconceitos com relação aos seus atendidos, de forma a deixa-los livres para produzirem novos sons e conhecerem novas músicas, permitindo também maneiras diferentes de autoconhecimento.
Compreender aquilo que se desejaria expressar através da criação de músicas e do manuseio de instrumentos, indo ao encontro do outro e ajudando-o a dar forma a esta expressão, torna-se a principal função da musicoterapia.
Com o tempo, a percepção de “eu e do outro” propiciada também pelas ações da música diminuiria as sensações de afastamento da realidade e facilitaria o reconhecimento, por parte de cada um, do seu próprio “eu” (Zanini, 2004).
A música, enquanto instrumento terapêutico, auxilia na diminuição do stress, promove o relaxamento, combinando os sons com as técnicas corporais; organizando o ritmo interior e exterior do ser humano.
Como parte do todo gigantesco que é a arte, promove o autoconhecimento e o autocontrole corporal e mental, utilizando a expressão sonoro-musical como meio de descarga física e emocional, equilibrando tensões.
Ao utilizar os elementos da música, o musicoterapeuta pode possibilitar uma intervenção que englobe o indivíduo em sua totalidade, em diversos âmbitos, tanto individualmente, referindo-se ao nível físico, mental, psicológico e espiritual, como socialmente, num contexto de relações sociais, históricas e culturais (Zanini, 2004).
Reflexões sobre a Musicoterapia
Como definição, a musicoterapia seria um processo sistemático de intervenções em que o terapeuta ajudaria seu atendido a promover sua própria saúde utilizando experiências musicais e as relações que se desenvolvem através delas como forças dinâmicas de mudança (Bruscia, 2000).
De acordo com Santos (1998): “A música pode lançar pontes sobre o vazio da solidão, do medo, do sofrimento. Assim ela cria possibilidades de encontro, facilita o desenvolvimento de relacionamentos interpessoais. Ao mesmo tempo a música ajuda a contatar os próprios sentimentos”.
No dia a dia, estejamos sozinhos ou acompanhados, todos nós podemos perceber os impactos da música sobre nós. Quem nunca foi embalado por um ritmo ou se deixou levar pela melodia triste de uma canção de amor?
Enquanto arte, ela roda o mundo, está em todo lugar. Como instrumento terapêutico, faz parte da vida de todos, mesmo que não saibamos ou que seu efeito seja indireto na gente.
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A música pode dizer muito sobre nós, sobre nossos gostos e temperamentos. E assim como ela tem esse poder, tem também o poder de mudar vidas, dando um meio para que pessoas possam se expressar e mesmo aprender a se conectarem consigo mesmas. Na saúde mental não é diferente…
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Qual o ano da publicação desse texto?
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Olá, este texto é de 2019
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Parabéns pelo Artigo. O conhecimento acerca desse assunto é muito importante para os cristão do mundo inteiro.
Esse tema ainda é um tabu e muitos tem resistência e medo por se tratar de um assunto misterioso.
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Ótimo texto! Sempre quis fazer alguma formação em musicoterapia pq sei do efeito terapêutico da música.
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Olá, belo artigo!
Apenas gostaria de deixar registrado que faz falta saber quais referências foram utilizadas para a sua construção, sei que dá trabalho referenciar mas é sempre bom para que possamos aprofundar mais nossas buscar.
Muito obrigado pelo conhecimento proporcionado!
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Também gostaria de informações sobre as referencias e sobre o autor, Pablo Valente.
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Ola! Gostaria de saber quais profissionais podem atuar nessa area?
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Olá Milena, a musicoterapia é uma profissão. É preciso fazer um curso de graduação ou especialização para tornar um musico terapeuta. Já a música de maneira geral na conexão com a pessoa qualquer pessoa pode utilizar e é um recurso fantástico.
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Olá Pablo, você teria alguma indicação de alguém que fale sobre os benefícios da música para a saúde mental.
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Olá, o Luizinho Gonzaga
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Muito obrigado pelo conhecimento proporcionado, mas
Seria muito importante se tivesse as referências biográficas, é um assunto muito importante. Principalmente na área da Educação Infantil.